Boletim Informativo da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas Junho/2001 - Nº 115
   

Qual é o mar que banha a Bolívia e o Mato Grosso?


"Muitos profissionais acabam restringindo o seu conhecimento técnico às suas atribuições e, muitas vezes, desenvolvendo-as maquinalmente"

     Na semana passada voei de São Paulo para Lima, no Peru. Com duas horas de viagem, a aeromoça que servia bebidas olhou pela janela e me perguntou: - É mar?
     Eu fiquei surpreso. Imaginei que tinha pego o vôo errado, pois não me lembrava de nenhum mar entre São Paulo e Lima. Pensando um pouco, falei que provavelmente seria o Pantanal Matogrossense, pois não me lembrava de um outro lugar no meio do continente Sul Americano com tanta água.
     Mais tarde, acabei indo para a cozinha e continuei o papo com ela. Perguntei se aquela era a sua primeira viagem para o Brasil naquela rota, e ela disse que não, que a fazia regularmente, para minha surpresa e do professor de geografia do colégio que ela estudou.
     Fiquei pensando naquilo e me lembrei de um artigo que havia lido do filósofo Rubem Alves, na Folha de São Paulo. O fato era muito parecido, somente que ele voava entre São Paulo e Londrina e a aeromoça confundiu o rio Paranapanema com o rio São Francisco. No artigo o grande Rubem Alves questionava a preparação dos profissionais e como muitas pessoas acabavam restringindo o seu conhecimento técnico às suas atribuições e, muitas vezes, desenvolvendo-as maquinalmente.
     Mas será que esse problema é apenas localizado ao conhecimento de geografia das aeromoças de diferentes companhias latino-americanas? Infelizmente não.Como professor, tenho notado que os estudantes, tanto da graduação como da pós-graduação, desenvolvem os seus deveres de casa e projetos escolares maquinalmente, restringindo-se àquilo que é literalmente pedido. O problema, obviamente não é a nota que o estudante vai tirar, mas como ele se portará no futuro, como um profissional.
     A investigação, a procura pelas respostas às perguntas, isso se restringe a um pequeno grupo de alunos em cada turma.
A hidrogeologia e as outras ciências ambientais, assim como muitas novas áreas do conhecimento, obrigam que os profissionais pesquisem e busquem novas soluções. As receitas prontas funcionam para alguns casos, mas em outros há necessidade de inovar ou de adaptar velhas formulas a novas situações.
     Ser capaz de inovar, agregar conhecimento às suas ações, tem sido um diferencial dos novos executivos neste mundo competitivo.
     Mas essa atitude não é somente em uma direção. As empresas são também responsáveis em propiciar que essa inovação realmente ocorra, criando um ambiente propício e, sobretudo, dado tempo e incentivos aos profissionais que desenvolvam novidades em seus trabalhos.
     E na terceira ponta está a universidade que deve buscar em seu ensino que o estudante seja um questionador e que saiba pesquisar as soluções aos seus problemas.
     Caso isso não ocorra na nossa área vamos ter profissionais como aquele da piada que ouvi já há alguns anos: um executivo chega chateado para conversar com o chefe e perguntar por que um funcionário mais novo que ele foi promovido. O chefe então diz: -você notou que há homens trabalhando na rua da frente, vá ver o que eles estão fazendo. O executivo retorna com a resposta: - estão consertando o encanamento. Pergunte quando a obra vai terminar? Depois de uns minutos, vem o executivo dizendo: - Uma semana. Vá ver agora o que a polícia está fazendo para melhorar o trânsito. E novamente vem o executivo com a resposta….Agora, chame o funcionário que eu promovi. - João vá ver o que está acontecendo aí na frente do prédio. Dez minutos depois, chega João: - A companhia de água e esgoto está trocando a rede de água do bairro. O conserto durará uma semana e devido a isso o tráfego de carros foi desviado para a avenida paralela a nossa. Já providenciei com a polícia de trânsito uma forma de melhorar o acesso à nossa garagem para nossos clientes.

Ricardo Hirata é professor do
Instituto de Geociências da
USP, pesquisador do CEPASIGc-
USP e Secretário
Executivo da ABAS. Hirata
escreve mensalmente nesta
coluna.
e-mail: rhirata@usp.br;
fax: (11) 3818.4207.


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