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Qual
é o mar que banha a Bolívia
e o Mato Grosso?
"Muitos profissionais acabam restringindo o seu conhecimento
técnico às suas atribuições e, muitas
vezes, desenvolvendo-as maquinalmente"
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Na
semana passada voei de São Paulo para Lima, no Peru. Com duas
horas de viagem, a aeromoça que servia bebidas olhou pela janela
e me perguntou: - É mar?
Eu fiquei surpreso. Imaginei que tinha
pego o vôo errado, pois não me lembrava de nenhum mar entre
São Paulo e Lima. Pensando um pouco, falei que provavelmente
seria o Pantanal Matogrossense, pois não me lembrava de um outro
lugar no meio do continente Sul Americano com tanta água.
Mais tarde, acabei indo para a cozinha
e continuei o papo com ela. Perguntei se aquela era a sua primeira viagem
para o Brasil naquela rota, e ela disse que não, que a fazia
regularmente, para minha surpresa e do professor de geografia do colégio
que ela estudou.
Fiquei pensando naquilo e me lembrei de
um artigo que havia lido do filósofo Rubem Alves, na Folha de
São Paulo. O fato era muito parecido, somente que ele voava entre
São Paulo e Londrina e a aeromoça confundiu o rio Paranapanema
com o rio São Francisco. No artigo o grande Rubem Alves questionava
a preparação dos profissionais e como muitas pessoas acabavam
restringindo o seu conhecimento técnico às suas atribuições
e, muitas vezes, desenvolvendo-as maquinalmente.
Mas será que esse problema é
apenas localizado ao conhecimento de geografia das aeromoças
de diferentes companhias latino-americanas? Infelizmente não.Como
professor, tenho notado que os estudantes, tanto da graduação
como da pós-graduação, desenvolvem os seus deveres
de casa e projetos escolares maquinalmente, restringindo-se àquilo
que é literalmente pedido. O problema, obviamente não
é a nota que o estudante vai tirar, mas como ele se portará
no futuro, como um profissional.
A investigação, a procura pelas
respostas às perguntas, isso se restringe a um pequeno grupo
de alunos em cada turma.
A hidrogeologia e as outras ciências ambientais, assim como muitas
novas áreas do conhecimento, obrigam que os profissionais pesquisem
e busquem novas soluções. As receitas prontas funcionam
para alguns casos, mas em outros há necessidade de inovar ou
de adaptar velhas formulas a novas situações.
Ser capaz de inovar, agregar conhecimento
às suas ações, tem sido um diferencial dos novos
executivos neste mundo competitivo.
Mas essa atitude não é somente
em uma direção. As empresas são também responsáveis
em propiciar que essa inovação realmente ocorra, criando
um ambiente propício e, sobretudo, dado tempo e incentivos aos
profissionais que desenvolvam novidades em seus trabalhos.
E na terceira ponta está a universidade
que deve buscar em seu ensino que o estudante seja um questionador e
que saiba pesquisar as soluções aos seus problemas.
Caso isso não ocorra na nossa área
vamos ter profissionais como aquele da piada que ouvi já há
alguns anos: um executivo chega chateado para conversar com o chefe
e perguntar por que um funcionário mais novo que ele foi promovido.
O chefe então diz: -você notou que há homens trabalhando
na rua da frente, vá ver o que eles estão fazendo. O executivo
retorna com a resposta: - estão consertando o encanamento. Pergunte
quando a obra vai terminar? Depois de uns minutos, vem o executivo dizendo:
- Uma semana. Vá ver agora o que a polícia está
fazendo para melhorar o trânsito. E novamente vem o executivo
com a resposta
.Agora, chame o funcionário que eu promovi.
- João vá ver o que está acontecendo aí
na frente do prédio. Dez minutos depois, chega João: -
A companhia de água e esgoto está trocando a rede de água
do bairro. O conserto durará uma semana e devido a isso o tráfego
de carros foi desviado para a avenida paralela a nossa. Já providenciei
com a polícia de trânsito uma forma de melhorar o acesso
à nossa garagem para nossos clientes.
Ricardo
Hirata é professor do
Instituto de Geociências da
USP, pesquisador do CEPASIGc-
USP e Secretário
Executivo da ABAS. Hirata
escreve mensalmente nesta
coluna.
e-mail: rhirata@usp.br;
fax: (11) 3818.4207.
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