Boletim Informativo da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas Junho/2001 - Nº 115
   

Água subterrânea salva cidades cearenses do colapso

"A construção do poço resultou na maior obra hídrica subterrânea já
executada no Estado do Ceará"

     O Estado do Ceará, vem perseguindo de forma determinada e efetiva a execução de ações voltadas para a eliminação da utilização de carros-pipa, prática que vem ocorrendo, nos períodos críticos de colapso de oferta d'água às comunidades interioranas, inclusive sedes municipais, fato este decorrente de irregularidades climáticas, que assolam o território cearense em quase sua totalidade.

     Consciente de que é fundamental alcançar o desenvolvimento local sustentável no interior cearense, e de que a eliminação na utilização dos carros-pipa, é uma premissa básica, o Governo Estadual através de ações renovadas, busca mais uma vez atacar a problemática de frente e fazer com que essa prática no abastecimento d'água às comunidades rurais seja uma questão que passe a constar somente da história do Ceará.

     A maioria das comunidades cearenses são abastecidas por reservatórios superficiais, que quando secam, cidades inteiras vão ao caos, obrigando-se, a recorrer e reverenciar o vergonhoso "abastecimento" através carro-pipa. Pois, apesar de ser importante, ter um açude não significa ter água constantemente na torneira, principalmente nos Estados Nordestinos onde os índices pluviométricos são irregulares fazendo ocorrer cíclicos e longos períodos de estiagem, sendo ainda atingidos por uma elevada taxa de evaporação que "refresca" o sol o ano todo. Por esses indesejáveis fatores climáticos é que devemos pesquisar e conhecer mais nossas potencialidades hidrogeológicas, principalmente os aqüíferos Missão Velha, Rio da Batateira, Apodí, Serra Grande, e Rio do Peixe, visando a construção de poços tubulares profundos para o aproveitamento da água subterrânea como reserva estratégica para esses períodos de baixa nos níveis dos reservatórios, como a exemplo deste momento, onde o Estado do Ceará encontra-se com apenas 37,8% da sua capacidade de armazenamento em reservatórios superficiais, ou seja 3,9 bilhões de metros cúbicos, segundo dados da Companhia de Gestão de Águas do Estado. A água superficial é importante e deverá ser utilizada muito antes que se evapore ou escoe direto para o mar. Mas enquanto a água subterrânea não receber o tratamento e o respeito que merece como reserva estratégica, capaz de ser utilizada nos períodos mais críticos, principalmente no Nordeste, jamais poderemos pensar na eliminação total desse tão oneroso, ineficaz e insalubre "sistema de abastecimento" através de carro-pipa.
     Pensando nisso é que o Estado do Ceará dá um grande passo, avançando na busca do conhecimento e aproveitamento dos seus aqüíferos. Pois neste sentido está sendo executado um programa de construção de poços pioneiros de grandes profundidades nas bacias sedimentares do Estado.
     O início desse programa teve como área piloto a Chapada do Araripe, por se tratar de uma área dotada de uma geologia bastante complexa e interessante, composta principalmente por rochas sedimentares Jurássicas e Cretáceas, e que há bem pouco tempo não se tinha obras hídricas subterrâneas que pudessem dar subsídios para o ratificação de alguns estudos técnicos já realizados, como também poder contribuir para o conhecimento concreto a respeito das suas verdadeiras potencialidades hidrogeológicas e ao mesmo tempo dar a importância devida para o aproveitamento delas, como forma de acabar com a carência de água principalmente para o consumo humano naquela região.
Foram construídos na primeira fase 03 (três) poços tubulares profundos onde o principal deles foi na Serra dos Carneiros, município de Araripe com uma vazão de explotação de 400 m³/h e uma capacidade específica de 7,3m³/h por metro rebaixado, sendo um dos níveis estáticos mais rasos dentre os poços construídos na Chapada - 375 m.
     A profundidade de perfuração atingiu 950 m, mas foi completado apenas com 737 m, devido os principais aqüíferos produtores, Rio da Batateira e Missão Velha, estarem posicionados entre 540 m e 700 m, e a partir daí somente foram encontrados folhelhos e argilas vermelhas da Formação Brejo Santo.
     Todo o trabalho, desde a locação até a completação do poço, foi executado diretamente pela Superintendência de Obras Hidráulicas do Estado do Ceará - SOHIDRA, utilizando uma Sonda T-50 na perfuração.
     Os estudos de prospecção geofísica para a locação foram executados pelos geólogos da SOHIDRA, Francisco de Assis Capistrano e Carlos Hindemburgo N. Holanda, que investigaram a Chapada até 1000 m de profundidade.
     A construção do poço que resultou na maior obra hídrica subterrânea já executada no Estado do Ceará, teve o acompanhamento técnico do geólogo da SOHIDRA Francisco de Assis Barreto, e contou com a consultoria do Engº de Minas Raimundo Bezerra de Medeiros.
     Com essa obra o Governo do Estado irá garantir o abastecimento das cidades de Araripe, Salitre, Campos Sales e alguns distritos pertencentes a esses municípios, que receberão através de uma adutora que traçará um percurso de 75 quilômetros, água em quantidade suficiente para atender a demanda e com boa qualidade, já que o poço produz água com características físico- químicas dentro dos padrões de potabilidade para o consumo humano.
     
Baseado em índices de crescimento populacional do IBGE, calcula-se que estas cidades e distritos num horizonte de 30 anos demandarão apenas 75% da capacidade de explotação do poço.
     Professores, Técnicos e estudiosos da Universidade do Vale do Cariri - URCA, já estão estudando a amostragem de calha do poço, visando a identificação de novas ocorrências fossilíferas na Chapada.
     Além dos benefícios sociais, essa obra traz dados de caráter científico, que com certeza irão contribuir no conhecimento e entendimento da geoestratigrafia, paleontologia e potencial hidrogeológico da Chapada do Araripe, que ainda pouco de concreto conhecemos sobre suas potencialidades hídricas e informações geológicas no geral.
     Podemos afirmar que é viável e necessário a utilização das águas subterrâneas não somente nos municípios privilegiados por posicionarem-se nas áreas de bacias sedimentares, mas através de adução poderemos transferir essas águas para suprir muitas cidades posicionadas sobre o embasamento cristalino, onde os aqüíferos fissurais geralmente não apresentam grandes vazões e na maioria das vezes a água não é de boa qualidade, necessitando a instalação de aparelhos dessalinizadores. Porém, é necessário o desenvolvimento de um modelo racional de uso integrado das águas, para que as águas subterrâneas nunca sejam utilizadas enquanto as superficiais estejam evaporando ou escoando para o mar, e, nem tão pouco se dêem ao luxo de estarem guardadas puras e cristalinas no interior das formações produtoras, enquanto o fundo dos reservatórios superficiais estorricam marcando a seca e a destruição. Pois sabendo usar não vai faltar.

Francisco de Assis Barreto
Geólogo da Superintendência de
Obras Hidráulicas do Estado do Ceará.
Fone: (85) 231-6563


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