Artigo de leitor gera polêmica

Na última edição, o ABAS INFORMA publicou um artigo enviado por Natan Sebastião de Oliveira em que denunciava uma exploração de minérios, podendo colocar em risco o meio ambiente e contaminar águas subterrâneas da Estância Hidromineral de São João da Serra, em Patrocínio, Minas Gerais. O artigo endossado pelo engenheiro agrônomo Reginaldo José de Oliveira, o geólogo José Eustáquio e o produtor Valdete Fernandes de Mello acabou sendo publicado pelo ABAS INFORMA, já que o informativo segue uma linha totalmente imparcial, com o propósito de divulgar e debater os assuntos em questão. O artigo resultou em várias manifestações da comunidade das águas subterrâneas, inclusive da empresa Galvani citada no artigo por seus referidos autores. Segue manifestações de geólogos e profissionais da região Minas Gerais:

     “O Núcleo de Minas Gerais foi pioneiro no debate do tema Água e Mineração, talvez a primeira vez que esse tema foi debatido no âmbito da ABAS tenha sido aqui em Belo Horizonte, por ocasião do VII Congresso, no ano de 1992. A nossa preocupação reflete-se ao fato de que na região da Serra do Salitre, situada no município mineiro de Patrocínio, não ocorre o aqüífero Guarani mas sim rochas metamórficas do Pré-Cambriano e as intrusivas do Cretáceo. O Mapa Geológico do Estado de Minas Gerais, editado em 1994 pela Companhia Mineradora de Minas Gerais – Comig, na escala 1:1.000.000, apresenta para a área rochas da Suíte Alcalina de Salitre e dos grupos Bambuí, Araxá e Canastra. Segundo este mapa a ocorrência mais próxima de rochas da Bacia do Paraná encontra-se cerca de 40 km a oeste da Serra do Salitre. De imediato, não sabemos se haverá ou não impactos sobre as águas subterrâneas, mas de qualquer forma o aqüífero impactado não seria o Guarani”.

Diretoria Núcleo ABAS-MG

     “Li o último número de vosso conceituado jornal, uma reportagem sobre possível contaminação do aqüífero Guarani, oriundo de atividades minerais futuras no Complexo da Serra Negra referindo-se inclusive a super exploração do conjunto hidrológico regional – águas superficiais e sub superficiais – e à poluição radiativa regional causada pelos rejeitos do processo. Como geólogo, tenho atuado na área de mineração e meio ambiente por mais de 20 anos, não tenho absolutamente nenhum vínculo com a empresa detentora dos direitos minerários em questão – nem a conhecia, a fim da verdade – mas senti-me agredido tecnicamente e moralmente, pela má intenção implícita do mesmo quanto ao uso dos dados do projeto ambiental com intuito óbvio de denegrí-lo, ficando claras suas intenções. Deixo-me no direito de exprimir alguns pontos de vista sobre o texto, todavia ressaltando que um parecer substancial somente seria possível, através de uma ‘due dilligence’ sobre o processo do EIA-RIMA e os pareceres do órgãos pertinentes. A ‘perigosa carga radiativa’ dos rejeitos da mineração, que poderá poluir o aqüífero Guarani, trata-se de minérios de titânio em suas várias formas, desde o anatásio até a ilmenita, que detêm uma pequena carga de alguma terra rara. Não me consta que exista algum único caso de contaminação de qualquer espécie ou indivíduo, nas duas cidades citadas ( que conheço muito bem), ou que o estoque de ‘rejeitos’ tenha causado algum tipo de poluição além da visual. Creio que o missivista, sendo agrônomo, deveria preocupar-se mais com a poluição (em nada residual) causada pelo excesso de uso de fosfatos e outros adubos, nos córregos e nascentes que pretende defender. Creio ser esse tipo de poluição, muito mais agressivo que aqueles que ataca”.

Marcio Fernando Barci
Geólogo

     A matéria publicada no último número do ABAS INFORMA traz uma série de afirmações espetaculosas sobre o risco de contaminação das águas subterrâneas do Aqüífero Guarani, por parte da atividade mineradora na região de Patrocínio–MG. Demonstra de forma inequívoca não só o desconhecimento de conceitos banais em Hidrogeologia como a maneira preconceituosa como o tema Mineração é tratado, e vários fatos ali apontados não resistem nem a mais superficial análise do problema, senão vejamos:

     Aqüífero Guarani é descrito como “O maior lençol freático já descoberto no mundo”. Ora, o nome Aqüífero Guarani é novo apenas para leigos, sendo sobejamente conhecido pelos hidrogeólogos que militam na área , desde os tempos de calouro na Universidade, quando era conhecido como Aqüífero Botucatu. Além disso ele é tudo menos “lençol freático”, nome esse que ultimamente está caindo em desuso e que serve apenas para designar aqüíferos livres e rasos, sabendo-se que na sua maior parte, o Aqüífero Guarani se trata de um aqüífero confinado, à exceção nas áreas de exposição das formações geológicas que a ele dão origem. Segundo o próprio texto, esse empreendimento vai extrair rocha fosfática da chaminé alcalina de Salitre, que está encaixada em rochas metassedimentares pré-cambrianas, portanto o ambiente geológico é totalmente diverso daquele relacionado ao Aqüífero Guarani, que se compõe das formações Botucatu e Pirambóia, unidades sedimentares mesozóicas da Bacia do Paraná; portanto as condições de circulação de águas subterrâneas são totalmente distintas, além do que são geograficamente separadas, o que torna de todo impossível esse fenômeno. Seria bom que os leigos consultassem profissionais antes de emitir parecer sem o menor fundamento técnico, que servem apenas para confundir os menos esclarecidos. Aliás, esse fato tem sido sempre a tônica quando o tema envolvido é água subterrânea e a mineração.

      O texto fala de poços de até 400 metros de profundidade, “...que poderão atingir o Aqüífero Guarani...”, e aí temos um novo engano, pois se os poços não forem locados sobre o próprio Aqüífero Guarani, nem se a perfuração atingisse o Japão isso seria possível. Longe de desprezar os impactos decorrentes da atividade mineradora, que não pode ser considerada nem vilã nem heroína, mas apenas uma atividade econômica essencial a qualquer país organizado, de modo que devemos fazer as seguintes considerações:

      Barragens de Rejeito e Depósitos de Estéril são estruturas inerentes à atividade minerária, e devem não só ser projetadas e construídas segundo critérios técnicos rigorosos, como devem ter um programa de manutenção e monitoramento contínuo não somente durante toda a fase de operação da lavra como devem ter critérios próprios após o seu “descomissionamento”, que inclusive estão sendo exaustivamente discutidos e que serão objeto de Deliberação Normativa ora em elaboração, a ser oficializado pelo COPAM. Dessa forma, interessa realmente é como o licenciamento ambiental desse projeto está ou e vai ser analisado, uma vez que estão sendo feitas várias afirmações contundentes sobrem os impactos ambientais locais e regionais que serão gerados por esse empreendimento.. Lembramos que cabe ao DNPM a concessão e fiscalização da lavra de todos os bens minerais no Brasil, uma vez que tais são considerados bens da UNIÃO, e que esse órgão exige em Minas Gerais o Licenciamento Ambiental para que qualquer empreendimento mineiro de grande porte se instale . Será possível que o órgão ambiental estadual não tenha analisado esse processo, sabendo-se ainda que em qualquer caso desse tipo são exigidas medidas mitigadoras e compensatórias aos danos ambientais envolvidos? A competência legal para conceder o licenciamento ambiental para empreendimentos de grande potencial poluidor é do Conselho Estadual de Meio Ambiente – COPAM, após manifestação da Fundação Estadual de Meio Ambiente – FEAM, órgão do executivo que analisa todos os processos. Às prefeituras, cabe participar do processo através dos Codemas e Secretarias Municipais do Meio Ambiente, e deve a elas colocar sempre os anseios e exigências da comunidade para que os recursos naturais sejam preservados, em prol do desenvolvimento sustentado. Em recente artigo escrito para essa revista expus de modo esquemático o ciclo da água na mineração de ferro, que novamente está destacado ao lado. Embora não conheça a fundo os problemas apontados pelo artigo em referência, uma vez que se trata de ambiente geológico completamente distinto, é no mínimo estranho que todos esses problemas apontados não tenham sido estudados, como por exemplo à possibilidade de lixiviação de metais pesados expostos como se diz “ao relento”; acaso não foi elaborado um EIA-RIMA, documento obrigatório para novos empreendimentos e discutido amplamente com a sociedade em audiência pública todos os impactos ambientais a serem gerados? Afirma-se também que haverá o secamento de nascentes, alteração de regime hídrico de cursos d´água da região e prejuízo para os usuários de água a jusante do empreendimento. Todos esses aspectos, que dizem respeito ao uso da água, são objeto de autorização de outorga de uso, que é o instrumento legal que regula a utilização de água, tendo-se a bacia hidrográfica como unidade de gestão, sendo os comitês de bacia entidades criadas pela lei 9433/97, responsáveis pela ordenação do uso dos recursos hídricos na sua esfera geográfica de competência. Do mesmo modo não teriam sido considerados pelo Comitê de Bacia todos esses problemas, ou na falta deste, pelo órgão gestor estadual de recursos hídricos - o IGAM? Com a palavra os órgãos competentes estaduais.

Agostinho Fernandes Sobreiro Neto
Hidrogeólogo

     “Todas as águas subterrâneas das nascentes existentes na margem direita do vale do ribeirão Salitre são provenientes das rochas do Grupo Canastra que ocorrem nas porções sul e sudoeste da área estudada. Estas nascentes não possuem nenhuma relação ou influência das águas subterrâneas da margem esquerda do ribeirão Salitre nem com as águas das chaminés de Serra Negra ou de Salitre. O rio Espírito Santo e o ribeirão Salitre são os “níveis de base” das águas subterrâneas da área estudada e são os locais para onde migram as descargas dos aqüíferos locais. Estas águas subterrâneas na área em questão não “fogem” ou “percolam” para outras bacias hidrográficas ou ainda não se “infiltram” para grandes profundidades para “sair” subterraneamente nas bacias geológicas sedimentares do Paraná ou a do São Francisco. As condições geológicas, estratigráficas e estruturais da região não permitem que este “fenômeno” aconteça. A fonte que existia ao lado do poço tubular perfurado para abastecer a futura mineração não “secou”. Tal nascente foi drenada, propositalmente, através de filtros, para dentro do poço visando o seu futuro aproveitamento juntamente com as águas subterrâneas locais das fraturas mais profundas. As possíveis interferências da futura mineração sobre os recursos hídricos da área terão apenas influencia ou impacto local sem repercussão regional. Estas interferências são previsíveis e seus impactos poderão ser perfeitamente pré-determinados, monitorados e minimizados. As análises químicas das amostras coletadas neste trabalho mostraram que as águas subterrâneas na região estudada são provenientes de vários aqüíferos isolados geologicamente”.

Adelbani Braz da Silva
Geólogo Brazpoços-Phd em Hidrogeogia

 

Voltar Imprimir

Copyright © - Associação Brasileira de Águas Subterrâneas
Todos os direitos reservados