Calibração de Modelos Matemáticos de Fluxo e
Transporte com o Programa PEST

     1. Introdução

     Existem modelos matemáticos para quase tudo. Já foram desenvolvidos programas para o fluxo de águas em canais, para o fluxo de eletricidade em condutores de formas heterogêneas, para o crescimento de plantas, para a dinâmica populacional de formigas e assim por diante. Modelos necessitam dos seguintes quatro tipos (grupos) de dados, sendo que às vezes estes podem ser atribuidos a mais de um grupo. São eles:

     Dados fixos:

     Estes dados definem o sistema. Por exemplo a forma de aqüíferos ou a posição de poços de bombeamento em modelos matemáticos de águas subterrâneas.

     Parâmetros:

     Estes se referem às propriedades do sistema. Exemplos de parâmetros para modelos matemáticos de águas subterrâneas são: condutividade hidráulica, capacidade de armazenamento do meio poroso, etc. Um modelo pode possuir muitos parâmetros. Cada um deles se refere a um atributo específico do sistema, causando uma modificação da resposta do modelo no caso da entrada de um dado diferente ou de um distúrbio qualquer. Em modelos onde a localização é importante (modelos espaciais) as propriedades do sistema variam de lugar para lugar. Desta maneira, os parâmetros necessários para um modelo podem ser valores individuais para subregiões do modelo ou formulações que descrevem a maneira através da qual os valores se distribuem regionalmente.

     Distúrbios:

     Estes são os componentes que dinamizam o sistema, por exemplo a recarga ou a fonte de contaminação e sua localização num modelo matemático de fluxo e transporte. Assim como no caso dos parâmetros, os distúrbios podem ser dependentes regionalmente.

     Dados de Controle:

     Estes dados fornecem configurações para a solução numérica das equações do sistema. Exemplos são a especificação do grid do modelo matemático, critérios de convergência para o método de cálculo e assim por diante.

     O objetivo de todo modelo é bem ou mal a geração de números. Estes números são os resultados prognósticos do modelo para o sistema concebido frente a diferentes distúrbios. É por causa destes números que o modelo foi criado, seja ele um programa de apenas dez linhas, envolvendo somas e subtrações, ou procedimentos numéricos complexos para a solução de equações diferenciais parciais, como no caso de modelos matemáticos de fluxo e transporte.

     Mesmo concebendo um modelo para simular a realidade, muitas vezes não a conhecemos. Na verdade, freqüentemente utilizamos modelos para inferir a realidade. Por exemplo, se um modelo matemático de fluxo consegue reproduzir as variações temporais de nível d’água, podemos acreditar, que os valores de condutividade hidráulica escolhidos para as diversas regiões do modelo são corretos. Isto é muito prático, visto que campanhas para a determinação de condutividades hidráulicas são caras. A Figura 1 mostra o modelo e a relação de parâmetros, entradas e saídas.

     2. Programa PEST

      O programa PEST (Parameter Estimation, John Doherty, Watermark Computing, Austrália) nada mais é do que um programa que pode ser acoplado a um modelo qualquer para inferir aspectos da realidade, que não poderiam ser acessados através de medições diretas, devido ao custo ou inviabilidade técnica. Em geral o programa PEST pode ser utilizado para:

     Interpretações:

     Muitas vezes um experimento é concebido para se obter informações sobre propriedades de um sistema através de sua desestabilização (por exemplo, um ensaio de bombeamento num sistema aqüífero). O modelo é utilizado então para relacionar o distúrbio (bombeamento) e as propriedades do aqüífero aos valores de carga hidráulica medidos em campo. Os dados medidos podem ser então interpretados baseando-se na premissa, de que para um distúrbio conhecido, é possível estimar as propriedades do sistema com os dados coletados em campo (por exemplo, as condutividades hidráulicas são estimadas com os valores de carga hidráulica medidos em campo).

     Calibração:

     Quando um sistema é desestabilizado, e este distúrbio é simulado com um modelo matemático, pode-se então ajustar os parâmetros do modelo até que a saída do modelo corresponda aos valores observados no campo. Neste caso concluimos que o modelo irá representar o comportamento do sistema também para outros distúrbios, que não necessariamente podem ser executados empiricamente. Quando os parâmetros de um modelo foram ajustados desta maneira diz-se que o modelo está calibrado.

     Portanto, o objetivo do programa PEST é auxiliar na interpretação e na calibração de modelos. PEST ajusta os parâmetros do modelo até que as saídas correspondam aos valores observados em campo ou em laboratório. Além disto o programa PEST pode ser utilizado para identificar o caso mais crítico, por exemplo num cenário de contaminação, e ainda ser utilizado para acessar a sensibilidade dos parâmetros do modelo. PEST deve ser utilizado da seguinte maneira:

     1. Construa primeiramente um modelo coerente, mas não calibrado.
     2. Informe PEST quais parâmetros serão ajustados (valores de recarga ou condutividades hidráulicas, etc.).
     3. Forneça ao programa PEST a lista de observações efetuadas em campo (cargas hidráulicas, vazões, etc.).
     4. Deixe PEST rodar.
     5. PEST terminará os cálculos definindo os valores dos parâmetros de maneira que o erro entre os valores observados e os calculados pelo modelo seja mínimo. (vide Figura 2)

     O programa PEST oferece a possibilidade de se utilizar pesos para as diversas informações obtidas em campo, permitindo que dados seguros e mais representativos tenham um peso maior nos resultados.

     3. Conclusão

     PEST é um programa muito bom para auxiliar na calibração de um modelo de fluxo e transporte de águas subterrâneas. No entanto, não é possível deixar PEST efetuar toda esta calibração sozinho, sendo necessária uma participação intensa do modelador. Pode ocorrer que PEST escolha valores matematicamente corretos para os parâmetros, mas que não fazem sentido algum. PEST simplesmente miniminiza o erro entre valores observados e os calculados pelo modelo.

     O programa tem dificuldades na determinação de valores para os parâmetros em modelos matemáticos de águas subterrâneas que tenham muitas células secas, fazendo com que muitas vezes não haja convergência.

     O programa é muito bom para se acessar a sensibilidade dos parâmetros num modelo e também para definir o grau de correlação entre eles.

     PEST foi desenvolvido independentemente do tipo de modelo matemático a ser utilizado. Em muitos programas de modelamento matemático de fluxo e transporte de águas subterrâneas o programa PEST encontra-se integrado (Visual Modflow Pro (Waterloo Hydrogeologic Inc.), PMWIN (Wen-Hsing Chiang), entre outros.

     Olho: Mesmo concebendo um modelo para simular a realidade, muitas vezes não a conhecemos. Na verdade, frequen-temente utilizamos modelos para inferir a realidade.

Figura 1: Estrutura típica de modelos matemáticos

Figura 2: Gráfico de valores observados versus valores calculados pelo modelo
matemático após calibração com PEST.

Dr. Michel W. Kohnke
Tel: 1 (519) 746-1798 R.241
(11) 3030-9344 (São Paulo)
E-mail: mkohnke@flowpath.com

 
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