“Los Pozos Perdidos de Alquife”

A Mina de Alquife fica em uma região árida da Espanha com precipitação média de 350 milímetros por ano. Trata-se de uma região onde a gestão dos recursos hídricos é uma prática muito antiga, até hoje os sinos do Palácio Mouro de Alhambra regulam o uso dos canais de irrigação. Ainda existem captações de água subterrânea construídas, em sedimentos pouco consolidados, durante a ocupação árabe como as “acequias”. Tratam-se de túneis escavados sobre a superfície do nível d’água, com o teto e as paredes secas e estáveis, uma autêntica “lavra subterrânea de água”.

Em linhas gerais a geologia da área da mina resume-se em aluviões e coberturas detríticas do terciário quaternário sobrepostas a formações ferríferas e rochas carbonáticas (mármores) do triássico. O embasamento da área é constituído por xistos do mesozóico e paleozóico. A gênese do minério de ferro é similar ao quadrilátero ferrífero, em que a geração de hematitas e goetitas está intimamente ligada à circulação das águas subterrâneas, o chamado enriquecimento supergênico.

Os principais aqüíferos existentes são o minério de ferro e os mármores carstificados, ambos excelentes aqüíferos, com apenas três poços tubulares de rebaixamento do nível d’água, a mina bombeava uma vazão total de 1.170 m3/h. A cobertura detrítica constitui um aqüífero de menor expressão e com forte anisotropia vertical, devido à presença de matriz areno-siltosa e níveis mais argilosos. Poços tubulares com profundidades entre 150 metros e 200 metros, perfurados nas coberturas, apresentavam uma vazão média da ordem de 16 m3/h.
Os taludes são constituídos pelas coberturas detríticas, com espessuras de até 160 metros, para mantê-los secos e estáveis existia uma bateria de 32 poços tubulares com vazão total da ordem de 600 m3/h. Esta bateria estava situada fora da mina e apenas nos locais em que as coberturas estão sobrepostas aos xistos impermeáveis.

Além da bateria de poços, a drenagem dos taludes era realizada por uma peculiar estrutura de captação de água subterrânea, formada por outra bateria de 45 “pozos perdidos” ou poços de gravidade. Os “pozos perdidos” atuam como um dreno vertical conectando os sedimentos de menor permeabilidade com a zona carstificada, onde também se encontra o minério de ferro. O “pozo perdido” opera continuamente sem o uso de bombas, pois o nível d’água do aqüífero superior é mais elevado que o nível d’água da zona carstificada drenada pelos poços da mina.

O método de perfuração empregado em todos os poços foi a boa e velha técnica da percussão a cabo, em diâmetros de até 23 polegadas (poços do minério). Os “pozos perdidos” foram perfurados telescopicamente de 12 a 6 polegadas, utilizando filtros do tipo nold nos sedimentos e tubos ranhurados na zona cárstica, sem empregar qualquer tipo de pré-filtro. Sempre que os “pozos perdidos” não apresentavam uma boa conexão hidráulica com a zona carstificada era realizada a acidificação, com o consumo de 250 a 400 litros de ácido clorídrico comercial.

Na época em que visitei a mina, ainda em operação, para bombear um metro cúbico de da água pelos poços da mina eram necessários 0,662 kwh, ao passo que nos poços do aqüífero superior era despendido 0,734 kwh. Essa diferença é devida a existência de uma galeria com 3,5 km que conduzia a água da mina para um vale com cota mais baixa. Na saída da galeria a água era destinada a irrigação, recarga artificial de aqüíferos, abastecimento público e instalações da mina.

Visitei esta mina pela primeira vez em 1991, quando era operada por uma empresa francesa, retornei em um ou dois anos depois e ela havia sido vendida aos empregados por uma peseta. O minério produzido tinha baixo teor e problemas de qualidade na metalurgia, não estava conseguindo competir com o minério de ferro brasileiro. Em 1994, na minha última visita, ela já estava paralisada, mas o sistema de bombeamento continuava operando. Pelo que sei, hoje em dia, os poços de rebaixamento do nível d’água da mina continuam em operação, produzindo água para a comunidade. Quanto aos “pozos perdidos”, que de perdidos não têm nada, estão lá silenciosamente fornecendo água.

Antônio Carlos Bertachini
é Geólogo, Sócio da MDGEO Serviços de Hidrogeologia Ltda.,
empresa especializada em hidrogeologia aplicada à mineração
e-mail: mdgeo@gold.com.br

 
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