Técnicas de tratamento de água superficial

Água limpa, potável, segundo analistas especializados, promete ser o ouro deste novo século. Exageros à parte, a água para consumo humano é atualmente um das preocupações mais prementes de meio ambiente. Com a crescente demanda de água tratada, uma antiga técnica de tratamento, relativamente barata, ressurge como uma possibilidade de utilização de água superficial: a filtragem através dos próprios sedimentos de borda de rio. Este retorno está apoiado no grande desenvolvimento científico proporcionado pelo avanço da hidrogeologia no tratamento de solo e água subterrânea contaminados, que gerou tecnologias como barreiras reativas, oxidação in-situ, biodegradação, atenuação natural, apenas para citar algumas.

De maneira semelhante às barreiras reativas (apresentadas anteriormente nesta coluna), a filtragem pelos sedimentos da borda de rio permite um tratamento passivo através de vários processos, como adsorção, redução, filtração físico-química e biodegradação, permitindo a melhora da qualidade da água produzida para a facilidade do tratamento final para uso nobre.

Alguns países europeus usam esta tecnologia para aumentar a remoção de matéria orgânica natural, contaminantes orgânicos e micróbios patogênicos de até 80% de sua água potável (Suiça), 50% (França), 48% (Finlândia), 40% (Hungria), 16% (Alemanha) e 16% (Holanda). No resto do mundo, este tipo de filtragem não é tão comum porque a água superficial e subterrânea de qualidade é obtida com maior facilidade.

Este tipo de tratamento ocorre tipicamente em vales aluviais, onde predominam heterogeneidades físicas e geoquímicas. Na maioria dos vales predominam areias e cascalhos, entretanto, nas planícies de inundação ocorrem também depósitos interdigitados de silte e argila, tornando a estratigrafia complexa e dificultando a interpretação da distribuição das zonas de permeabilidades distintas e do modelo hidrogeológico resultante.

Apesar das dificuldades, os sedimentos filtrantes funcionam naturalmente como um reator biológico e hidrogeoquímico, permitindo a remoção de organismos patogênicos, por exemplo. Numa seqüência a partir do ponto de entrada da água nos sedimentos, a água inicialmente torna-se redutora, uma vez que a matéria orgânica tende a ser degradada em presença do oxigênio dissolvido, consumindo os aceptores de elétrons ali presentes; posteriormente, a água passa novamente a ser aerada até atingir a zona de equilíbrio entre as concentrações de oxigênio no ar e na água. É a partir deste ponto que os poços são instalados. Além disso, a própria matéria orgânica presente nos sedimentos funciona como um filtro de carvão ativado, retirando eventuais contaminantes orgânicos presentes na água, que passam a ficar adsorvidos nos sedimentos, podendo eventualmente ser degradados. A própria progressão dos ambientes hidrogeoquímicos permite que compostos inorgânicos sejam filtrados.

A zona de captação do poço, representada em planta pela área a partir da qual a água é direcionada para seu interior, representa também um fator de diluição da água proveniente do rio. Isto é, como a água que se dirige para o poço provém de todas as direções (360o), pelo menos toda a água que provém do lado oposto do rio (180o) é composta somente de água subterrânea, naturalmente mais protegida de contaminações do que as águas superficiais. Assim, soma-se a toda a filtragem, que é o objetivo maior deste sistema, a diluição com água subterrânea, concorrendo positivamente para o aumento da qualidade da água produzida.

Os avanços na área de remediação de aqüífero permitem uma compreensão maior e o uso do sistema de filtragem através dos sedimentos da borda do rio, baseando-se em avaliação hidrogeológica, caracterização hidrogeoquímica e modelagem matemática do sistema.

Dr. Everton de Oliveira
Professor-colaborador do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo e sócio-diretor da HIDROPLAN - Hidrogeologia e Planejamento Ambiental S/C Ltda. (everton@hidroplan.com.br)

Olho: Com a crescente demanda de água tratada, uma antiga técnica de tratamento, relativamente barata, ressurge como uma possibilidade de utilização de água superficial...

 
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