Ano Mundial da água (XI)

Depois das Nações Unidas haverem consagrado todo o ano de 2003 ao problema da água no mundo, ainda predomina a lógica tradicional de aumentar a sua oferta como única forma de combate aos desperdícios e degradação da sua qualidade em níveis nunca imaginados nas cidades. Entretanto, o crescente número de casos positivos nos países mais desenvolvidos, sobretudo, mostra que o uso da água subterrânea para abastecimento público e a romântica tentativa de uso cada vez mais eficiente da gota d’água disponível - tanto na agricultura, quanto nas cidades, por exemplo - são as alternativas mais baratas para solucionar problemas locais e ocasionais de escassez de água.

Da quantidade total de água da Terra - 1.386 milhões de km3 - as doces, isto é, aquelas cujos teores de sólidos totais dissolvidos - STD - são inferiores a 1000mg/L representam cerca de 2,5% ou 34,65 milhões km3. Deste total, os estoques de água nos rios e lagos são de 0,3% - 103 mil km3 e as águas subterrâneas representam 29,9% ou da ordem de 10,3 milhões km3. A quantidade restante de água doce da Terra forma as calotas polares e geleiras.

Na abordagem da gestão integrada da gota d’água disponível para desenvolvimento sustentável, os aqüíferos desempenham variadas funções. Nos países desenvolvidos, principalmente, onde meio copo de água significa meio cheio e uma oportunidade de ganhar mais dinheiro, as suas empresas de água costumam utilizar os métodos Aquifer Storage Recovery - ASR, por exemplo, para injetar nos aqüíferos os excedentes de água das enchentes dos rios, tratar esgotos domésticos com redução de 70% nos custos convencionais, controle da interface marinha, regulação de descarga de base dos rios e manutenção de santuários ecológicos, principalmente. Ao contrário, nos países pobres meio copo de água significa meio vazio, uma oportunidade para obter dinheiro a fundo perdido ou a juros privilegiados para enchê-lo.

Os mecanismos naturais de renovação da água da Terra são movidos pela energia solar e gravitacional, resultando na transformação da água salgada dos oceanos, em água doce. A UNESCO/PHI, 2003, indica que estes processos proporcionam uma descarga média total de longo período nos rios do mundo da ordem de 43.000 km3/ano, sendo as contribuições dos fluxos de água subterrânea durante o tempo que não chove da ordem de 13.000 km3/ano. Entretanto, a distribuição destes potenciais é muito irregular e os países onde a escassez de água é um problema milenar não se destacam pelas políticas públicas de uso racional.

O Brasil, embora ostente as maiores descargas do mundo nos rios, geradas nos seus territórios – 183.000 m3/s - e que a demanda total de água represente menos de 1,2% destes valores médios, costuma-se ressaltar que perto de 80% destes potenciais ocorrem onde mora pouca gente. Entretanto, em perto de 80% dos 26 Estados e Um Distrito Federal não há condições de “estresse hídrico”, ou menos de 1000 m3/hab/ano fluindo pelos rios, sem contatar que a extração de apenas 25% das recargas das águas subterrâneas representaria cerca de mais 4.000 m3/ano per capita. Todavia, sem controle de uso, extração da água subterrânea e sem aplicação das tecnologias disponíveis, o resultado positivo de um poço continua sendo como um prêmio de loteria.

Aldo da C. Rebouças
Prof.Titular Colaborador Inst.de Geociências, Pesquisador Inst. Estudos Avançados-Universidade de São Paulo, Consultor Secretaria Nacional de Recursos Hídricos

 
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