Qual foi a maior invencionice do século XX?

Já disseram que a inovação mais importante do século XX foi a gestão (O que é gerenciar e administrar, de Joan Magretta, Editora Campus). Antes de achar que a autora deveria considerar a Internet, o telefone celular ou mesmo o computador, é importante ver o que ela diz: A gestão, que é obter resultados com os recursos disponíveis, permitiu que tudo que nós temos hoje tenha sido possível. Sem gestão não chegaríamos à Lua ou mesmo não teríamos entrega de pizza no sábado à noite em nossas casas.

Mas analisando friamente esta afirmação de Magretta, de que as criações dependem da gestão, e tirando um pouco o seu exagero, é também possível afirmar que nós cientistas brasileiros (fazedores de ciência) não incorporamos esse conceito de forma apropriada e, por extensão, não fazemos chegar essas idéias aos bancos escolares (pelo menos nos cursos de graduação em geologia).

Os geólogos das universidades, que se dedicam ao desenvolvimento da ciência (e particularmente da hidrogeologia), mostram resultados bastante fracos no que realmente é importante aos nossos pares no exterior, publicação de artigos. Ora, gestão é fazer acontecer. Não adianta termos boas estratégias para fazer ciência e uma ótima metodologia, se não tivermos resultados (publicações). Gestão é focar em resultado e não no esforço. Nós cientistas adoramos ficar maquinando como uma coisa acontece, utilizamos todos os nossos esforços para isso, mas este não é o foco. O foco é o resultado que deve ser colocado em trabalhos de divulgação. Que adianta descobrir a área de descarga e as taxas de recarga do Sistema Aqüífero Guarani (essenciais para um real manejo do recurso) se não “publicizarmos” isso e não contarmos para ninguém.... Pior, se alguém o fizer depois da gente, esta não será uma descoberta brasileira.

Bem, alguém no fundo da sala poderia dizer: - Mas, o importante é a descoberta, é fazer boa ciência, e não deveríamos trocar boa ciência pela publicação! Concordo, mas mesmo assim não estamos gerenciando bem o nosso processo. Somente boa ciência pode permitir publicar em boas revistas. Neste caso, novamente, devemos pensar o processo do fazer ciência de forma mais ampla: idéia, financiamento, execução e publicação. Se o resultado é publicar em boas revistas, está implícito que devemos ter boas idéias e bons métodos e boas descobertas. Algo novo terá mais chance de ser publicado, em oposição a algo que todos conhecem. Se ficarmos tentando publicar por publicar, podemos ter chance em uma ou outra revista, mas a médio e longo prazo, fracassaremos. Resumindo, ter foco na publicação não quer dizer fazer ciência “só pra inglês ver”.

Normalmente, o maior erro da gente é não identificar o que devemos obter de resultado. No caso da ciência é produzir bons artigos. E no caso de uma indústria de locomotivas? O processo de gestão implica em reconhecer claramente os resultados. Em artigo assinado por Clemente Nóbrega (www.clementenobrega.com.br) na revista Exame (maio 2003), o autor cita o caso da GE. Quando Jack Welch chegou à empresa, ela era uma das maiores indústrias do mundo. Hoje 80% de seus lucros vêm de serviços. O negócio de locomotivas da GE é emblemático. Até 1985, a regra da empresa era quanto mais potente a locomotiva, melhor. Welch descobriu que o que o mercado queria não eram locomotivas melhores, mas a habilidade de transportar mais carga por menos dinheiro. A GE introduziu um sistema computadorizado para gerenciar a frota e saber quando a composição apresentava problemas e substituí-la rapidamente.

Outro exemplo neste campo é a Fedex, empresa de entregas... Ops, erro. A Fedex depois que descobriu que o que o cliente queria não era entrega de documento, mas sim, a tranqüilidade e a certeza de que a mercadoria chegaria sã e salva ao destino, a empresa realmente conseguiu se firmar neste mercado. Ela criou um sistema em que o cliente rastreia a mercadoria pela Internet, sabendo exatamente onde ela esta em todo momento.

Na mesma linha, o foco que requer a gestão também não tem sido assimilado corretamente pela indústria de poços. – O que quer o cliente que contrata uma empresa de perfuração de poços? Água subterrânea? Acho que o que ele procura é a resposta a sua pergunta: a perfuração de um poço resolverá meu problema de água? A insegurança que a heterogeneidade hidrogeológica (“o risco do fracasso do poço é só do contratante da obra”) causa ao cliente é um dos grandes inimigos da venda de poços.

Mas como fazer com que a empresa garanta a água para o cliente? 100% de acerto é impossível, mas o investindo em tecnologia e na formação de melhores quadros de hidrogeólogos (em oposição a fiscais de obra) ajudaria muito. Geólogos com conhecimento de hidrogeologia, municiados de informações de todos os poços existentes (ai a importância da outorga e cadastro de poços) na área permitirá melhores estatísticas sobre a vazão do futuro poço. Quando as empresas descobrirem que respostas mais precisas sobre o sucesso e o insucesso da obra de captação permitirão “fidelizar” o cliente, ai teremos um mercado mais promissor e sustentável.

 
Voltar Imprimir

Copyright © - Associação Brasileira de Águas Subterrâneas
Todos os direitos reservados