Água, para
geólogos, significa água subterrânea
Aproveito a oportunidade de trazer aos hidrogeólogos
uma rápida entrevista com o Dr. James F. Barker, pesquisador
da Universidade de Waterloo, no Canadá, realizada por ocasião
do Seminário Internacional sobre Remediação de
Locais Contaminados, realizado em julho próximo passado. Ele
acompanhou a criação e desenvolvimento do Centro de Pesquisas
de Águas Subterrâneas naquela instituição,
tanto como aluno de doutorado quanto como pesquisador e professor. A
história desse famoso centro muitas vezes confunde-se com a própria
história da hidrogeologia de contaminação, outras
vezes a antecipa. A presença do Dr. Barker no primeiro Seminário
Internacional sobre Remediação de Locais Contaminados
é emblemática por se tratar de um dos maiores nomes mundiais
da área de hidrogeologia de contaminação no presente
momento, que também tem ligações com o Brasil através
de pesquisas e do seu interesse científico, além de ligações
afetivas com nosso país e nosso povo. Marca, portanto, um início
auspicioso para este evento que promete ser o ponto de encontro dos
profissionais dessa área no nosso país.
Em primeiro lugar, o Sr. poderia nos contar como se
tornou um hidrogeólogo e como acabou chegando a Waterloo?
Barker: Eu trabalhava na área de exploração para
uma companhia petrolífera após ter terminado meu mestrado.
Eu tinha um interesse por pesquisa e soube que água era uma boa
área de trabalho. Para um geólogo, água significa
água subterrânea. A Universidade de Waterloo havia apenas
iniciado seu programa de Doutorado (PhD) em torno de 1974 e foi então
que eu me mudei para Waterloo. E fiquei nessa área do conhecimento
desde aqui cheguei. Certamente foi muito entusiasmante uma vez que aquela
área de pesquisas tinha de fato apenas começado no Canadá.
Waterloo é reconhecida mundialmente como o principal
centro de excelência em pesquisa em hidrogeologia de contaminação.
O Sr. poderia nos falar um pouquinho da sua interessante história
e dos seus pesquisadores? E como é que o campo de pesquisas de
Borden entrou nessa história?
Barker: Waterloo queria ser diferente das outras escolas de Geologia
e Ciências da Terra do Canadá e então decidiu enfocar
a Geologia de Engenharia e a Hidrogeologia. Bob Farvolden (já
falecido) havia sido contratado no início dos anos 70 e foi capaz
de atrair John Cherry e Peter Fritz para Waterloo. O sucesso desse grupo
permitiu que mais professores fossem contratados e Waterloo então
deslanchou. Foi uma combinação de pessoal talentoso e
ótimo momento. O campo de experimentos de Borden foi crítico
para o nosso sucesso até os anos 90. Nós éramos
a única universidade que possuía uma permissão
para lançar contaminantes na água subterrânea até
aquela época. John Cherry e outros andavam frustrados com estudos
de casos reais de plumas de contaminação de água
subterrânea porque as fontes geradoras eram praticamente desconhecidas
(onde, quando, quanto?). Ele teve a idéia de solucionar esse
problema da pesquisa através de gerarmos nossas próprias
contaminações. Desde os anos 80 Borden tem sido usado
para a demonstração de conceitos como dispersão,
degradação, dissolução de produtos imiscíveis
e também para desenvolver e demonstrar técnicas de monitoramento
de água subterrânea e tecnologias de remediação
como as barreiras reativas de Fe0.
Como um observador do desenvolvimento recente da hidrogeologia
de contaminação, comparando com a história passada,
o Sr. poderia tentar fazer alguma previsão para o futuro desta
área?
Barker: Acredito que a maior parte da pesquisas essenciais, de conceitos
principais, já foi realizada. O campo do conhecimento está
maduro. Os conceitos estão bem compreendidos. Deverão
acontecer refinamentos contínuos nas tecnologias de remediação
no futuro e aplicações melhores dos conhecimentos atuais.
Mas, quem sabe, podem existir grandes novidades que apenas estejam esperando
por bons pesquisadores para virem à tona.
O Sr. já visitou algumas vezes o Brasil, sendo
a primeira vez no início dos anos 90. Que mudanças importantes
o Sr. nota da sua primeira visita para esta última?
Barker: Agora existe uma comunidade de pesquisadores bem estabelecida
na área de hidrogeologia de contaminação e um rápido
desenvolvimento de experiência prática na investigação
e na remediação de locais contaminados. Também
me parece claro que a CETESB, que é a agência ambiental
com a qual tive contato, amadureceu em termos de regulamentação.
Pesquisadores brasileiros estão ficando conhecidos internacionalmente
e estão fadados a produzir suas próprias pesquisas de
nível internacional, não somente seguir os padrões
da América do Norte e Europa.
Que pesquisa específica poderia ser desenvolvida
no Brasil que é particular ao nosso país? Que perspectiva
o Sr. vislumbra de uma cooperação com pesquisadores no
Brasil?
Barker: Eu fico um pouco desapontado por não conseguirmos ainda
fazer um bom uso da experiência do Brasil com o uso do etanol
na gasolina. A América do Norte estão andando nesta mesma
direção e os problemas de contaminação que
nós encontraremos poderiam ser antecipados a partir de experiências
práticas e de pesquisas realizadas no Brasil. Esta oportunidade
está sendo perdida rapidamente. A remediação de
solos e água subterrânea em climas mais quentes é
outra oportunidade no Brasil. Possuindo uma indústria de petróleo
de excelente nível internacional como a Petrobras também
deveria servir como oportunidade para o avanço de pesquisas em
água subterrânea relacionadas ao petróleo que ultrapassem
os problemas de postos de combustíveis relacionados ao vazamento
de tanques subterrâneos. Na verdade, a cooperação
deve ser entre USP, CETESB (e outras universidades e agências
ambientais) e as indústrias com problemas ambientais como a própria
Petrobras. Waterloo sempre demonstrou interesse em realizar pesquisas
em colaboração com o Brasil. Nós nos beneficiamos
de excelentes alunos de doutorado (PhD) brasileiros (Everton de Oliveira,
Nilson Guiguer e vários outros) e pretendemos continuar assim.
Acredito que se USP e outros centros de pesquisa do Brasil puderem identificar
necessidades nas quais Waterloo possa ajudar, a cooperação
certamente ocorrerá.
Qual foi sua impressão do SIRLC (Seminário
Internacional sobre Remediação de Locais Contaminados)?
Qual a importância para os profissionais brasileiros na participação
de eventos desse tipo?
Barker: Eu fiquei muito bem impressionado pela grande quantidade de
participantes. Me parece que é uma excelente oportunidade para
que profissionais possam trocar idéias e experiências.
Gostei da combinação de resultados de pesquisa com experiência
prática dos consultores presentes. Também me pareceu muito
estimulante a presença conjunta dos proprietários dos
problemas ambientais e de técnicos das agências ambientais.
Sem dúvida, uma melhor remediação e maior proteção
ambiental deverá brotar de interação tão
boa entre a indústria, agências ambientais, consultores,
prestadores de serviços e pesquisadores.
Há algo mais que o Sr. gostaria de dizer da
sua audiência no Brasil?
Barker: Gostaria de agradecer pela oportunidade de mais uma vez observar
o desenvolvimento do Brasil nesta área e de participar neste
seminário de sucesso.
Dr. Everton de Oliveira é professor-colaborador
do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo
everton@hidroplan.com.br
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