A história de Rosa Rosa

Chamava-se Rosa Beatriz Gouvêa da Silva. Casou-se com um moço de sobrenome Rosa. Passou a chamar-se Rosa Beatriz Gouvêa da Silva Rosa. Para nós, do DAEE, era a Rosa Rosa. Geóloga, participou do Levantamento de Águas Subterrâneas do Estado de São Paulo e, dentro das atividades específicas do Departamento, prestou serviços também a outras entidades, do Brasil e do exterior.

Moça, muito moça, de idéias socialistas, evidentemente. Esteve na França. Quando ainda não era época de regressar encontrei-a sentada à sua mesa, ao chegar um dia ao nosso escritório.

- Já de volta?

Mostrou-me a perna engessada:

- Fui atropelada em Paris.

Com outros técnicos brasileiros, esteve em Lima, no Peru, estagiando junto a OPAS, organização Pan-Americana da Saúde, um organismo internacional de saúde pública dedicado a melhorar as condições de vida dos países das Américas. Também atua como Escritório Regional da Organização Mundial da Saúde para as Américas e faz parte dos sistemas da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU).

Terminado o período de atividades, Rosa Rosa e seus colegas resolveram fazer um pouco de turismo, visitando Macchu Picchu. Embarcaram na estação de Cuzco. O trem estava ainda parado na estação quando, subitamente, ocorreu a explosão. Um dos brasileiros, Mário Sérgio de Melo, geólogo, da turma da Rosa, da USP, então funcionário do IPT, relatou-me o que segue:

“Quanto às dúvidas sobre o atentado, vamos ver o que consigo lembrar-me: ocorreu no dia 25/06/1986, lá pelas 8:00 horas da manhã; foi atribuído ao grupo extremista Sendero Luminoso, na época muito ativo; além da Rosa e eu, estava conosco um terceiro brasileiro que também estagiava na OPAS, também da área de águas subterrâneas, paraibano, de olhos azuis, meia idade na época, enólogo amador; mas esqueci-me do nome dele, se me lembrar, envio-lhe*; no atentado, ele teve um braço fraturado pelo impacto de um estilhaço maior, perfuração de tímpanos e pequenos ferimentos decorrentes de pequenos estilhaços; o atestado de óbito da Rosa indicou traumatismo craniano, em conseqüência do impacto de um estilhaço grande, que também feriu-lhe o pescoço, e originou uma forte hemorragia; eu tive pequenos ferimentos de pequenos impactos, ainda trago no corpo alguns estilhaços milimétricos, e perfuração dos tímpanos; e um zumbido nos ouvidos de que nunca me recuperei;

- não é verdade que a Rosa estava sentada sobre a bomba; houve uma discussão sobre lugares, pois quando chegamos ao trem nossos lugares estavam ocupados, indevidamente, por outros passageiros; mas eles se retiraram e ocupamos nossos lugares; a bomba estava situada cerca de quatro ou cinco bancos à nossa frente;
- algo interessante: a bomba era de dinamite com pavio; foi introduzida no vagão por um menino, que entrou no vagão com o pavio já aceso, deixou a bomba no bagageiro, e saiu em seguida, sem ser notado (apuramos tudo isto depois); o cheiro do pavio queimando estranhou os passageiros; começamos a nos entreolhar (questão de instantes); então a Rosa levantou-se alarmada, olhou para mim e gritou: — ‘É uma bomba...’; é a última coisa de que me lembro antes da explosão; ela realizou no último instante o que estava para acontecer.

* o nome dele era Leomax (achei nas minhas anotações)...”.

Leomax, na ocasião, trabalhava na CETESB. Seu nome todo é José Leomax dos Santos. Ficou internado num hospital em Lima, onde recebeu a visita da esposa, que havia ficado no Brasil.

Depois de nove meses ganharam um temporão.

Engenheiro Euclydes Cavallari
(11) 3031-6473
alicecv@uol.com.br

 

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