A leitoínha de Avaí
Pequena cidade do interior de São Paulo com, atualmente,
4 615 habitantes, sendo 3 196 na área urbana, antiga Jacutinga,
fica perto de Bauru. O prefeito dizia que Bauru ficava perto de Avaí.
Nós, o extinto DOS – Departamento de Obras Sanitárias
– havíamos planejado, projetado e fiscalizado as obras
de implantação do sistema de abastecimento de água.
Faltava apenas a execução de um reservatório
elevado, a “torre“, para o início do seu funcionamento.
Antes do advento do Plano Nacional de Saneamento, com a implantação
das companhias estaduais, entre elas a SABESP, as cidades do interior
paulista eram orientadas pelo DOS. O esquema era o seguinte: elaborado
o projeto técnico, estabelecido o orçamento das obras,
calculava-se a despesa mensal de amortização e juros
do financiamento a ser concedido pela Caixa Econômica Estadual
de São Paulo, dividia-se essa despesa pelo número de
ligações que iriam ser atendidas, obtendo-se assim a
taxa média mensal. Pagável essa taxa, o processo era
encaminhado à Caixa para concessão do financiamento.
Impagável, geralmente para cidades pequenas, determinava-se
o máximo pagável e o resto era subsidiado pelo Governo
Estadual. Miopemente decretada sua extinção, o DOS,
no seu final, ficou cubiculado em duas pequenas salas de um prédio
no Largo São Francisco, em frente à Faculdade de Direito.
Numa delas, o Diretor Geral. Na outra, dois engenheiros e uma secretária
que havíamos ficado encarregados de apagar as luzes, fechar
a porta e devolver as chaves do moribundo Departamento.
Um dia recebi o prefeito de Avaí. Desanimado, sentou-se à
minha frente, calado, colarinho desabotoado, gravata desapertada,
torta, terno de vir a São Paulo empoeirado pela viagem de trem.
Cumprimentou-me, tomamos um cafezinho encomendado ao bar do térreo,
pago por mim, que a verba correspondente já tinha acabado e
não se podia encaixar em “outros”. Depois de um
tempo, tomou fôlego e desabafou, tristemente:
- Caí na “viabilidade”!
A expressão, compreensível apenas para alguns poucos
iniciados, estava inserida no contexto do economês, que começava
a imperar na linguagem técnica da Engenharia. Significava que
o município de Avaí, com 3 196 habitantes na aérea
rural, isso hoje, deveria contratar uma empresa consultora particular,
sem licitação por se tratar de firma de notório
saber, pagar uma parcela considerável do orçamento das
obras do reservatório, para ser elaborado um estudo de “viabilidade
técnica, econômica e financeira”. Era imprescindível
saber-se se seria possível “tecnicamente” construir-se
um reservatório de cem metros cúbicos, igual a muitos
que já haviam sido feitos, se era viável, “econômica
e financeiramente” dotar-se a cidade de saneamento para evitar-se
as doenças de transmissão hídrica, se haveria
um retorno de alta relação benefício custo, como
se faz quando se quer iniciar uma plantação de batatas.
- Como o senhor sabe que “caiu na viabilidade”, prefeito?
- O Doutor Chiara me disse, consultou uma lista que tinha em mãos.
O Doutor Chiara era o último Diretor Geral do DOS. O meu professor
da Poli, o Engenheiro José Chiara, figura humana excepcional,
coração maior que o mundo, tinha de obedecer à
esdrúxula determinação superior. Procurei animar
o prefeito, comprometendo-me a falar com o Chiara para que ele convencesse
o Secretário de Obras, Eduardo Riomey Yassuda, a autorizar
o financiamento sem o estudo de viabilidade. Não tive sucesso
na tentativa de animação. Saiu sem nenhuma esperança.
Eu também não esperava nada, conhecida a intransigência
do Yassuda. Mas a minha idéia não era falar com o Diretor
Geral. Eu pretendia ludibriá-lo, no estilo dos funcionários
que submetem ao superior um pedido de aquisição de material,
começando com “uma dúzia de xícaras descartáveis
de plástico para cafezinho, uma dúzia de copos descartáveis
de plástico para água, dois quilos de pó de café,
dois quilos de açúcar, dez rolos de papel higiênico
etc. etc.” e como último item, depois de uma enorme relação
de ninharias: “um refrigerador tipo frigo bar para a sala dos
funcionários”. O superior, enfastiado, evidentemente,
não lia até o fim e autorizava, sem perceber, a compra
da geladeira.
Assim fiz. A secretária, acumpliciada, levou ao Diretor um
monte de ofícios a serem assinados e, embaixo de todos, o de
encaminhamento à Caixa do pedido de financiamento do reservatório.
A esperança é que ele, cansado de tanta papelada, não
leria até o final, mas assinaria. Saindo a secretária
da sala dele, perguntei-lhe se havia assinado. - Assinou, mas não
caiu na conversa, não. Leu tudo, mas fingiu que não
tinha percebido, não disse nada e assinou.
O excelente Chiara! Abriu a porta da sua sala, parou de pé,
olhou para mim, sério e pediu à secretária comprimidos
de “Veramon”. Sabia que iria ter dores de cabeça
administrativamente superiores. Foi o último reservatório
elevado de cem metros cúbicos construído sob a gestão
do DOS, sem terem sido realizados caros e cuidadosos estudos para
ver se era possível fazê-lo. Algum tempo depois recebi
em casa um engradado de madeira com uma leitoínha dentro e
um cartão: “De minha reserva pessoal para a Páscoa
do amigo engenheiro. Hildo Nogueira, prefeito de Avaí”.
Mas meus filhos não deixaram “a reserva pessoal”
pururucar em pascoalinos torresmos. Enamorados dela, obrigaram-me
a enviá-la a um tio em Leme, que a conservou no seu sítio,
sem a sacrificar.
Os índios de Avaí. A Aldeia Araribá, situada
no município de Avaí, é a última reserva
indígena de toda a região. Os índios Terena e
Guarani, que a habitam, conservam suas tradições e costumes.
Os relatos históricos informam que os Terena, no período
pré-colonial, chegaram a atingir nível de produção
que os distinguia dos demais grupos nativos, dada a excepcionalidade
de seus cultivos agrícolas, artesanato e tecelagem. Com a expansão
da colonização viram-se privados de sua infra-estrutura
econômica, perderam autonomia como grupo, passando a formar
configuração social dependente dos interesses da sociedade
nacional. Nas circunstâncias atuais, o exercício das
relações comerciais, principalmente de artesanato e
das práticas de subsistência, representam as alternativas
viáveis aos Terena, desde que mantida a posse comunitária
da terra. Isso permite assegurar a unidade étnica ao lado de
alguns elementos culturais, tradicionais, dentro das unidades familiares.
Engenheiro Euclydes Cavallari
(11) 3031-6473
alicecv@uol.com.br
Homenagem da ABAS às mulheres
Você que busca no dia a dia sua
independência, sua liberdade, sua
identidade própria;
Você que luta profissional e
emocionalmente, para ser
valorizada e compreendida;
Você que a cada momento tenta ser a
companheira, a amiga, a “rainha do lar”;
Você que batalha incansavelmente por seus próprios direitos
e também
por um mundo
mais justo e por uma sociedade sem violências;
Você que resiste aos sarcasmos daqueles
que a chamam de, pejorativamente, de
feminista liberal e que já ocupa um
espaço na fábrica, na escola, na
empresa e na política;
Você, eu, nós que temos a capacidade de
gerar outro ser, temos também o dever de
gerar alternativas para que a nossa Ação
criadora, realmente ajude outras
mulheres a conquistarem
a liberdade de Ser...