Nilson Guiguer Junior!
Hidropersonalidade, como diz o Giampá. Das mais notáveis. Vale o chavão: “Dispensa apresentação”. Mas a culpa foi minha. Senão vejamos. No curso de Engenharia Civil, Nilson foi meu aluno na disciplina de Saneamento, em que eu tratava da captação de águas subterrâneas para abastecimento. Com pouca profundidade, sem querer fazer trocadilho, devido ao pouco tempo disponível, mas com o carinho que o assunto sempre me mereceu. Um dia, no ano em que se formou, ele foi me procurar na sala do Departamento.
- Mestre, eu gostei muito dessa parte de águas subterrâneas que você nos deu nas aulas de Saneamento. Aliás, eu nem sabia que existisse hidrogeologia. Pra mim, aqüífero era um lençol subterrâneo, era um rio que corria embaixo da terra.
Na verdade, acho que não foi bem isso o que ele disse, mas a idéia era essa. - Estou interessado em me desenvolver e trabalhar nesse assunto. Você pode me orientar?
- Não sou a pessoa mais capacitada, sem falsa modéstia. Mas vou indicar outro professor, hidrogeólogo, excelente técnico, de fama internacional. Também não lembro se foi bem isso o que eu disse, mas a idéia era essa. A indicação era óbvia: Aldo da Cunha Rebouças.
- Você vai ao Instituto de Geociências da USP e se apresenta ao Aldo.
Ele foi, apresentou-se e fez uma entrevista. Satisfatória esta, o Rebouças ofereceu um estágio para o Nilson no próprio IGUSP. O moço desempenhou-se muito bem nas suas tarefas, agradando aos orientadores e até ao Rebouças, o que não é fácil. Lembro-me de que um de seus primeiros trabalhos foi o levantamento das condições de contaminação de aqüíferos por aterros sanitários no Vale do Paraíba.
Na ocasião foi-me visitar no Departamento e me contou, muito entusiasmado e com minúcias, o que estava fazendo: perfurando poços piezométricos em que media o nível d’água, dos quais retirava amostras para análises e assim determinava a importância da propagação dos contaminantes. No próprio Instituto de Geociências obteve mestrado em hidrogeologia, o que, como diria minha sogra, “foi um lance em África” para um “mero engenheiro civil”, como diria o Ivanir. Depois de alguns anos em que trabalhou no Brasil, Nilson foi ao Canadá, onde, na Universidade de Waterloo, completou doutoramento.
Contrariamente a Napoleão, lá ele venceu. Com um colega americano da Universidade, fundou uma firma de consultoria em Águas Subterrâneas, a Waterloo Hydrogeologic.
Desenvolveu projetos, estudos, programas incríveis, principalmente inacreditáveis para um “mero engenheiro civil” como eu, da fase pré-computadores e pré-sondas perfuratrizes de decente eficiência. Mandou-me de presente um software chamado “Flowpath” que me permitiu reduzir a horas os dias que eu usava antes para calcular e mostrar aos meus alunos as linhas de corrente, as piezométricas, resolver as benditas equações diferenciais do fluxo etc... etc... Coisas assim terríveis: “Equação de COOPER-JACOB: s = 0,183(Q/T)Log10(2,25 tT/r²S) = (Q/4pT)[lne(1/u)-lne1,78], onde: s = rebaixamento, Q = vazão, T = transmissibilidade, r = distância ao poço em bombeamento, S = armazenabilidade, u = r² S / 4 t T. Descreve o fluxo a um poço em aqüífero confinado em regime transiente, para valores pequenos de u”.
(Apud “Estudos hidrogeológicos” – ABAS)
Lembro-me do notável livro do Emilio Custódio, espanhol, da Universidade de Barcelona, que continha, em anexo, um diagrama cartesiano em papel transparente no qual se devia adaptar, depois de muitas tentativas fracassadas, o gráfico obtido com os dados experimentais, para se obterem as variáveis hidrogeológicas de interesse. Nilson Guiguer Junior me libertou de todo esse trabalho. Não que eu não goste de matemática. Muito pelo contrário. Continuei a tratar as equações do fluxo, só que a sua solução havia ficado uma brincadeira.
Nada tendo a ver com o que estou contando, mas já que falei do Custódio, não esqueço da sua alegria contagiante, tipo artilheiro que marcou gol, aos socos no ar, quando, no primeiro Congresso da ABAS, em Recife, ao qual compareceu, comemorou a escolha de Salvador como sede do segundo Congresso. Mas Nilson não se restringiu ao Canadá. Vinha freqüentemente ao Brasil e participou de inúmeros eventos, congressos da ABAS, palestras, mesas redondas, não só em São Paulo, mas em todo o país. Aqui fundou uma filial, a “Waterloo Hydrogeologic Brasil”, acho até que tupiniquinamente com “s” mesmo e não “z”. Penso que em Santo André, se não me falha a memória.
Pertence, como diria o Fernando Cordeiro, ao “Panteon dos Deuses” das águas subterrâneas. Rememoro com muito carinho o ex-aluno, colega de formação, companheiro nas águas subterrâneas, meu compartilhador de artrose.
Engenheiro Euclydes Cavallari
(11) 3031-6473
alicecv@uol.com.br

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